Com população carcerária estimada em 18 mil pessoas, penitenciárias cheias e xadrezes de delegacias superlotados, o Ceará tem 57.686 mil mandados de prisão em aberto. Ordens judiciais não cumpridas pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), mas que foram expedidas pela Justiça para tirar de circulação suspeitos e condenados de assassinatos, assaltos, sequestros, estelionatos, estupros e outros delitos, ou para recuperar detentos desaparecidos, testemunhas não localizadas e fundamentais para o andamento de processos.
O número integra um ofício, ao qual O POVO teve acesso com exclusividade, emitido pela SSPDS para o Centro de Apoio Operacional Criminal, da Execução Criminal e do Controle Externo da Atividade Policial (Caocrim), do Ministério Público do Estado do Ceará (MP-CE). O levantamento foi feito a pedido do MP, data do último dia 4 e é assinado pelo delegado Tarcísio José Moreira Coelho, da Delegacia de Capturas (Decap).
Membro do Caocrim, a promotora de justiça criminal Fernanda Marinho atribui o acúmulo de mandados à impossibilidade de atuação da Polícia Civil, sobrecarregada, segundo ela, por trabalhos de custódia dos presos. "É surreal a colocação de preso em delegacia. Diante dessa onda de violência, a Polícia está investigando menos de 5% dos crimes que chegam ao conhecimento das autoridades."
Cada mandado em aberto, no entanto, não corresponde a um suspeito, condenado, preso ou testemunha desaparecido. A mesma pessoa pode ter mais de uma ordem judicial. "Mas, para ser decretada uma prisão preventiva, por exemplo, o crime tem que ser grave, apenado com reclusão e (a prisão) ainda tem que ser para a garantia da ordem pública", explica a promotora.
No ofício, a SSPDS não especifica a natureza dos mandados (prisão preventiva ou decorrentes de condenação). Segundo Fernanda Marinho, porém, o caso já é de conhecimento de vereadores, deputados estaduais, desembargadores e até do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Dos 57,6 mil mandados, 13.001 são para residentes em Fortaleza e 33.741, para o Interior. Os 10.944 restantes citam naturais de outros estados. Do total, 19% referem-se a assassinatos. De janeiro a abril deste ano, ocorreram 1.356 homicídios dolosos (com a intenção de matar) no Ceará. Em 2012 inteiro, foram 3.565 casos. "Ao invés de investigar, a gente faz papel de carcereiro. Mas preso não é obrigação da Polícia; é da Justiça", desabafa um policial que não quis se identificar.
Um inspetor completa: "Esses bandidos soltos são a essência da criminalidade! Por isso que está essa sensação de insegurança e Fortaleza virou uma das cidades mais violentas do Brasil. Tem fim de semana que estão matando 50. O governador pode colocar é 100 mil ‘militar' na rua que não vai resolver. A Civil precisa de mais gente para investigar, localizar os culpados, prender e ajudar os juízes a deixar esses bandidos na cadeia, e não ficar em delegacia servindo de babá."
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